sábado, 6 de outubro de 2012

Acordar, Lisboa - Campos

[alguns destes versos citados, desta vez, em mais um  álbum de Eduardo Gajeiro, sobre Lisboa, recentemente editado e que T. folheou ontem, na FNC - «não há verba, não há»]
 
[com cortes; ver, «quase completo», por exemplo, no «MULTIPESSOA»
 
Acordar da cidade de Lisboa, mais tarde do que as outras,
Acordar da rua do Ouro
Acordar do Rossio, às portas dos cafés,
Acordar
E no meio de tudo a gare, a gare que nunca dorme,
Como um coração que tem que pulsar através da vigília e do sono.
 
Toda a manhã que raia, raia sempre no mesmo lugar,
Não há manhãs sobre cidades, ou manhãs sobre o campo
[...]          (...)
 Uma espiritualidade feita com a nossa própria carne.
Um alívio de viver de que o nosso corpo partilha,
Um entusiasmo por o dia que vai vir, uma alegria por o que pode
acontecer de bom,
São os sentimentos que nascem de estar olhando para a madrugada,
[...]          (...)
 
A mulher que chora baixinho
Entre o ruído da multidão em vivas...
O vendedor de ruas, que tem um pregão esquisito,
Cheio de individualidade para quem repara...
O arcanjo isolado, escultura numa catedral,
Siringe fugindo aos braços estendidos de Pã,
Tudo isto tende para o mesmo centro,
Busca encontrar-se e fundir-se
Na minha alma.
 
Eu adoro todas as coisas
E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.
Tenho pela vida um interesse ávido
Que busca compreendê-la sentindo-a muito.
[...]

[não datado]
 
Transcrito das páginas 97 e 98 da edição da poesia de Campos organizada por Teresa Rita Lopes para a Assírio & Alvim, 2002
 
 
 

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