domingo, 16 de setembro de 2012

Lisboa de Cesário e de Eugénio

[abre amanhã mais Uma Estação;- o Agricultor estará no seu Campo;
- nunca foi Fácil; muito menos em tempos de «descartáveis»]

[e há o reencontro com os textos de outras, anteriores Estações]

EM LISBOA COM CESÁRIO VERDE

Nesta cidade, onde agora me sinto
mais estrangeiro do que um gato persa;
nesta Lisboa, onde mansos e lisos
os dias passam a ver as gaivotas,
e a cor dos jacarandás floridos
se mistura à do Tejo, em flor também;
só o Cesário vem ao meu encontro,
me faz companhia, quando de rua
em rua procuro um rumor distante
de passos ou aves, nem eu sei já bem.
Só ele ajusta a luz feliz dos seus
versos aos olhos ardidos que são
os meus agora; só ele traz a sombra
de um verão muito antigo, com corvetas
lentas ainda no rio, e a música,
sumo do sol a escorrer da boca,
ó minha infância, meu jardim fechado,
ó meu poeta, talvez fosse contigo
que aprendi a pesar sílaba a sílaba
cada palavra, essas que tu levaste
quase sempre, como poucos mais,
à suprema perfeição da língua.


1986

Eugénio de Andrade, Homenagens e outros epitáfios [1.ª ed: 1974]

Transcrito das páginas 249-50 da Poesia, 2000

 

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